Estamos em festa, é Carnaval no Brasil e cada um, no seu modo e tempo de vida, vive os festejos de Momo. Lembro que nasci numa segunda feira gorda, como é chamada a véspera do Carnaval, em todos os calendários.
Dados dos acontecimentos do ano de 1949, informam que as músicas de carnaval mais cantadas e tocadas e seus respectivos intérpretes foram: Brasileirinho, Waldir Azevedo; Chiquita Bacana, Emilinha Borba; Normalista, Nelson Gonçalves; Chuvas de Verão, Francisco Alves; Cabelos Brancos, 4 Ases e um Coringa; Nega Maluca, Linda Batista; Conceição da Praia, Marlene. Os Cantores do Rádio emprestavam o nome e o prestígio para fazer “bombar” os sucessos nos bailes dos Clubes Festivos e Familiares que sucederam os Cassinos, fechados pelo Presidente Dutra em nome da “moral e dos bons costumes”.
Quanta alegria espalhada por todo o Brasil, nos Bailes, nos Corsos, nas Batalhas de Confete e de Pó de Arroz. Na cidade onde nasci, as festas de rua eram embaladas pelo desfile da Tia Suzana, uma Boneca gigante, assim como os Bonecos de Olinda. Nos festejos, rolava muita serpentina colorida, confetes, aspersão de lança-perfume, jogados pelos brincantes uns contra os outros.
Porém, o desfile era aberto oficialmente com seriedade e pompa pelo Bloco dos Marujos (a Marujada), que desfilava garbosamente pelas Avenidas da Cidade de Itacoatiara, abrindo o Carnaval. Ainda não havia o “politicamente correto” e alguns blocos tinham suas marchinhas temáticas com linguagem abusiva ou de tom pejorativo e até de insulto.
Mesmo as músicas gravadas para o carnaval por artistas de renome não escapavam desse pecado capital. Pelo menos uma das mais cantadas no ano em que nasci era eivada de racismo e, hoje, é abominável: Nega Maluca. Tive sorte, naquele ano de 1949, a Estação Primeira de Mangueira (RJ) foi a campeã do Carnaval no desfile das Escolas de Samba Não Oficiais, as que romperam com a liga de escolas de samba que recebiam ajuda do Governo para desfilar. A Mangueira venceu com o enredo “Apologia aos Mestres”, exaltando os vultos históricos da cultura oficial brasileira, uma tendência que vinha ainda da Ditadura de Getúlio Vargas, que buscava criar uma identidade nacional.
Foi um ano “quente” não só para o Carnaval, que começa a se descolar das asas oficiais ou oficiosas dos governos e assegura às massas uma participação mais importante, saindo dos clubes para as ruas em celebrações onde já apareciam as primeiras relações do carnaval com a crítica social, uma celebração popular com propósitos políticos.
O mundo estava virado mesmo. Falava-se muito em democracia e progresso, reconstrução dos escombros gerados pela II Grande Guerra e falava-se, também, em Revolução, com os partidos de esquerda reabilitados total ou parcialmente. Logo no dia primeiro de janeiro de 1949, ocorre o cessar-fogo na Guerra travada entre Índia e o Paquistão, duas grandes nações que surgiam naquele momento dos escombros do colonialismo britânico; no dia 10 de março, termina a guerra Árabe-Israelense, iniciada em 1948, onde o Sionismo do Estado criado para fazer prosperar a paz entre Árabes e Judeus, mesmo com o fim do conflito, dava sinais de uma beligerância que parece não ter fim até os nossos dias; em 04 de abril nasce a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), essa mesma que agora está enfraquecida e ameaçada de falência total pelo novo imperialismo americano; em 29 de agosto, a extinta URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas), hoje Rússia, testa a sua primeira bomba nuclear, dando início à “Guerra Fria” entre os blocos de poder representados pelos Estados Unidos da América do Norte e URSS; em 7 de setembro nasce a República Federal da Alemanha; em 1° de outubro é oficializada a criação da República Popular da China. E, no Brasil, a nova Direita é representada pela União Democrática Nacional (UDN); o Partido Social Democrata (PSD) e Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que abrigavam, respectivamente, os ditos liberais de centro e militantes de esquerda dos partidos postos na clandestinidade, tidos como comunistas ou socialistas.
Portanto, nós, os nascidos no ano de 1949, vivemos uma história inteira cujo enredo é memorável! Ao longe, já se avista o Carro Alegórico da Velha Guarda, que resiste ao tempo!
Texto: Walmir de Albuquerque Barbosa – Escritor e Jornalista